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Pai e filho subindo vulcões

  • ctbretas
  • 27 de set. de 2024
  • 10 min de leitura

Essa viagem em 2008 foi outra experiência maravilhosa onde eu e Lucas saímos de casa atrás de uma aventura pelo Sul do Chile, em pleno verão. Andréa não pode ir. Morávamos numa casa grande com dois cachorros da raça dog alemão. Poucas são as pessoas que se prontificam a cuidar de dois gigantes de oitenta quilos. Essa situação já havia ocorrido quando eu e Lucas fomos para a Califórnia, anos antes. Talvez por isso, hoje optamos por morar em apartamento, sem cachorro. Fica mais fácil fechar a porta e arrumar uma ajuda para apenas dois gatos super independentes. 

Na viagem aérea, tudo normal. Lanches sem graça e sem sustança. Mas ver os Andes da janelinha modifica tudo. Esquecemos a fome e acompanhamos cada detalhe quase sem piscar. Já haviam me dito para na ida sentar no lado direito do avião. Boa dica. Depois de passar por cima de Mendoza, na Argentina, a visão do Aconcágua e das montanhas ao seu redor é realmente maravilhosa. 

Meu amigo da época de república na faculdade, Carlos Patrício, já havia retornado a viver em Santiago e foi nos pegar no aeroporto. Ficamos na sua casa durante um dia. Sim, passeamos bastante durante o dia e à noite jantamos, com algumas cervejas. No dia seguinte, o Patrício trabalharia. Era auditor médico. Nós ficaríamos passeando pela cidade para conhecer a belíssima Santiago. Era a primeira vez que eu ía para aqueles lados. No final do passeio, eu e Lucas pegamos as bagagens e embarcamos na rodoviária de Santiago. Agora sim, começaria a aventura de ônibus até Púcon, cidade mil quilômetros ao sul.

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Prá falar a verdade, a aventura começou na rodoviária. Estávamos com fome e a viagem era prevista para às 19:00h. Chegamos às dezoito e pouco e pedimos um sanduba com batatas fritas. Demorou muito prá ficar pronto e a quantidade era impressionante. Acabamos tendo que comer muito rápido e, mesmo assim, não conseguimos comer tudo. Saímos correndo para não perder o ônibus. Pior, era um ônibus comum, lotado, sem ar condicionado num calor insuportável de verão chileno e nós cheios de bagagens. Parecia esses ônibus que levam de volta para casa, nordestinos que tentaram a vida num grande centro. Sempre aprendendo com o sofrimento.

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A viagem durou a noite toda. Ao amanhecer, passamos pelo belíssimo Lago de Villarica e chegamos a Púcon antes das 7:00h da manhã. O nosso hostel era bem perto da estação e facilmente nos alojamos. A cidade é muito pequena, mas bastante bonita e aconchegante. A vista, de qualquer lugar, do vulcão Villarica, sempre com saída de fumaça no seu cume, é um espetáculo à parte. Um charme mesmo. Caminhamos pela rua principal, tomamos um bom café da manhã e fomos conhecendo o local. Muito artesanato com uma estrutura totalmente voltada para o turismo. Praias de lago, comercio de esporte de inverno e aquático, hotéis de ótima qualidade, uma península muito bonita e passeios ao vulcão de Villarica, o maior ponto turístico da cidade. No segundo dia, por ser verão, saímos cedo para fazer um raffiting pelo rio Trancura. O passeio foi maravilhoso, com um visual de cinema. Escolhemos o raffintg mais forte com várias quedas de padrão cinco, o que já transforma o passeio num nível de emoção bastante alto. Na única queda que só pode ser feita por profissional, a de nível 6, nos obrigaram a descer do barco e andar pela mata, por um estreito caminho. Para nossa surpresa, ainda teríamos que saltar de volta pra água, do alto de uma pedra de cinco metros de altura no intuito de conseguirmos voltar ao bote. Lucas morria de medo de altura, mas não tinha volta. Acabou se atirando com seu colete salva-vidas. Era um rio gelado, mas com um azul lindo, mais escuro que o do céu. Contrastava com os vários tons de verde da vegetação e o vulcão totalmente branco pelo gelo, ao fundo. 

Depois desse passeio, voltamos para o centro da cidade para o almoço. Alugamos bicicletas para passearmos pela região com mais comodidade. Fomos visitar uma aldeia indígena localizada logo após cruzar o rio Trancura, num nível mais perto da cidade que o raffiting que havíamos feito. Aproveitamos e compramos algumas coisas no supermercado para abastecer nosso quarto no hostel. No dia seguinte iríamos começar a viagem mais ao sul ainda. 

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Aluguei um carro pequeno, afinal de contas, éramos só eu e Lucas, com muita vontade de aventura. Saímos de carro para a cidade de Villarica contornando o vulcão do mesmo nome que a cada momento parecia mais lindo. Alcançamos o Lago Calafquén, na pequena cidade de Licán Ray. As estradas que pegaríamos na parte de ida da viagem eram só as vicinais, passando por fazendas magníficas e cidadelas mínimas. O visual era deslumbrante como imaginávamos.  Dalí, seguimos para o lago Panguipulli, belo ao extremo, com uma cor azul impressionante. A própria cidade de Panguipulli era bastante arrumadinha. Fomos até o Chalqén onde almoçamos o famoso "bife a lo pobre", um excelente prato tipo bife à cavalo, muito comum no Chile.

Nessa linda estrada, paramos em frente a uma fazenda para Lucas fazer xixi. Eu, como um pai atormentado, tirei foto, mas ele não descobriu naquele momento. Ficou muito contrariado quando na volta da viagem, mostrei a foto aos familiares.

Seguíamos pela Los Lagos quando decidi entrar para cortar caminho pela Nacul-Desague, uma estrada terciária totalmente de pedras. Eles chamam de rípio, em razão de na época da neve facilitar a passagem. Só passamos por dois ou três caminhões em sentido contrário tal era a ausência de pessoas loucas que optavam por utilizar aquele caminho. Foi divertido, embora o medo de que um pneu furasse incomodava. Algum auxílio naquela estrada seria quase impossível de ser encontrado. Depois alcançamos a cidade de Frutono e avistamos outro belíssimo lago, o Ranco. Nesse dia, acabamos indo dormir num hotel simples, mas maravilhoso no Lago Puyehue. O café da manhã foi servido numa varando com uma visão lindíssima do lago. O sol se levantando e vários barcos a remo. Um contraste lindo e uma calma acolhedora. 

Após essa sensação maravilhosa de um café da manhã com aquele visual, saímos com destino ao Lago Rupanco até alcançarmos o Lago Llanquihue. Nesse caminho, tive uma das visões mais lindas até hoje. Estávamos de papo e a observar a estrada com fazendas de criação de cavalos, pastos muito arrumados e viniculturas deslumbrantes. Avistamos o Vulcão Osorno. Ainda distante, mas a magnitude daquela montanha impressionava. Passamos a seguí-lo, cada vez chegando mais perto daquele esplendor natural. Realmente foi uma visão maravilhosa. Já tínhamos visto outros vulcões no caminho, alguns com fumaça saindo do seu topo, mas a grandiosidade do Osorno, no meio daquela paisagem, foi apaixonante.

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Ao alcançarmos Puerto Octay, resolvi rodear o Lago Llanquihue pelo lado esquerdo. Foi uma escolha maravilhosa por que descobrimos vilas e praias, a maioria apenas com chão de pedras lindíssimas, além de uma vegetação muito abundante. Ao mesmo tempo, chegamos ao vulcão que desejávamos. Subimos a montanha para o vulcão até o centro de ski de Osorno e de lá, um  teleférico para chegarmos mais alto ainda. Como ventava muito, Lucas morria de medo com as cadeirinhas a balançar, fato que me divertia. Não havia qualquer perigo. Assim chegamos ao ponto mais alto do teleférico. A vista: de um lado, o lago azul maravilhoso. Do outro, as geleiras imponentes. Sublime esse passeio. Caminhar num terreno irregular formado de lavas antiquíssimas era difícil, mas muito bom ao mesmo tempo. Penhascos enormes, sempre com o lindo azul do céu, o branco da neve, e a cor escura do terreno vulcânico em contraste permanente.

Descemos, depois de muitas fotos e almoçamos perto da Laguna Verde, outro lugar encantador. Essa lagoa tem uma água totalmente da cor verde esmeralda e desemboca num lago totalmente azul. O contraste produzido por esse encontro de águas é totalmente mágico. Sem falar que a lagoa é cercada de uma vegetação importante e muito densa. O restaurante era bem turístico, logo encontramos um garçom brasileiro e, pior, de Três Rios, cidade perto de Petrópolis, onde morávamos. Alguns conhecidos em comum, muitas risadas e, de novo, rumo à estrada. Fomos até Petrohué e suas quedas de água muito violentas pelo degelo. De barco fomos até Peulia, quase fronteira com a Argentina.

Outro passeio lindo foi seguir o grande Lago Llanguihue até Puerto Varas e Frutillar. Sempre tendo o fabuloso vulcão Osorno ao fundo e o lago à sua frente. Acabamos pela manhã indo para Puerto Montt. Passeamos pela via litorânea e conhecemos a cidade portuária mais ao sul do continente chileno. Depois dela, só de barco até alcançar a Patagônia sul, bem no extremo gelado do continente. Mas isso fica para uma próxima vez.

Resolvemos conhecer a cidade de Osorno que nada tem a ver com o vulcão. É uma cidade histórica e do interior, típica de cowboys chilenos. Um forte histórico de rodeo e atividade pecuária. Nessa cidade, Lucas me aporrinhou por que queria ir até Bariloche, na Argentina. Eu também gostaria de atravessar pelos Andes, mas o carro era alugado e eu não sabia se poderia sair do país. Sempre soube de problemas com brasileiros viajando de carro pela Argentina. Guardas exigiam propinas a toda hora. Resolvemos então deixar o carro no hotel por três dias e irmos de ônibus. Assim ele ficaria feliz, mas tenho que confessar que eu também. Sempre quis fazer esse passeio de cruzar os Andes ao sul. Fomos de ônibus por uma estrada maravilhosa e nem mesmo o tempo perdido na fronteira fez com que a gente se arrependesse do passeio. Chegamos em Bariloche e fomos atrás de hotel. Embora fosse verão, a cidade sempre lota de turistas. Arrumamos um no centro da cidade. No início da noite, nos divertimos pelas ruas do centro, comemos carnes de ótima qualidade e chocolates fantásticos. 

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No dia seguinte, fomos até o porto LlaoLlao e de barco até o Puerto Blest, na fronteira entre Argentina e Chile. Passeio bonito. Caminhada nas florestas dos Andes, cachoeiras, lagos e árvores sensacionais. Em um hotel bacana, de frente para o lago, almoçamos. O “moleque” gosta de comer mesmo, não importa onde esteja. Na volta, um jantar com mais carnes argentinas, coisa que fascinava o Lucas. Era verão e Lucas não gostava muito de teleférico então resolvemos, ao invez de ir ao Cerro Catedral, irmos para Villa La Angustura, outro lugar belíssimo, o Lago NahuelHuapi soberano durante todo o caminho. Deu tempo para vermos muitas coisas em Bariloche, mesmo sem estarmos de carro. Usamos bastante o transporte público, que não deixou a desejar.

Na volta a Osorno, passamos novamente pelos caracolles, estrada muito íngreme que desce ou sobe a montanha e recheada de curvas, facilitando o trânsito nos Andes. 

Chegamos a Osorno, no Chile, a tempo de pegarmos o carro no estacionamento do hotel e voltarmos para Púcon. Agora, pela highway 5 para ganharmos tempo e chegarmos ainda com o sol brilhando no belo entardecer local. Mais uma vez, passamos perto da prefeitura da cidade onde tem um sinal demonstrativo da situação atual do vulcão que pode estar verde, amarelo ou vermelho, sendo que nesse último é necessário esvaziar a cidade pelo risco de erupção. Lucas se sentiu aliviado por sempre ter estado verde.

No dia seguinte, havíamos marcado uma subida-escalada ao topo do vulcão Villarica onde chegaríamos a um local para ver as lavas dentro da cratera. Infelizmente, por estar com neblina muito forte, a excursão foi cancelada. Como estávamos de carro, fomos visitar a bela Playa Negra em Caburgua. Fomos também nas termas naturais em Villa de San Pedro. Muito legal. Piscinas naturais com água em 40º graus no meio de um local muito frio. No verão, o clima externo era quente e o Lucas ainda mergulhou no rio de água bastante fria que passava ao lado dessas termas. Durante o inverno é interessante por que se misturam, naturalmente, a neve no chão e as piscinas aquecidas. Deve ser muito engraçado vermos pessoas de shorts e biquínis dentro d’água com muita neve ao redor delas.

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Ainda encontramos uma cachoeira linda, conhecida como Três Saltos com água esverdeada e com três níveis de quedas em diferentes locais. As fotos tiradas nesse local até hoje nos encantam.

Antes de entregarmos o carro no dia seguinte (último dia em Púcon), pegamos a estrada e fomos passeando por caminhos bastante ruins, mas com um visual deslumbrante. Passamos pelo Lago Quillehue, um dos formadores do rio Trancura, até alcançarmos o vulcão Lanin, o mais alto da região. Estrada muito ruim, mas um passeio sensacional e com emoção. É um caminho que também te leva à Argentina, conhecido como passo, mas realmente tem meios melhores para se chegar ao país dos “hermanos”. 

Na entrega do carro, outro sufoco. Alugamos de uma agência pequena que não abria o dia todo (até por que alugava mais jet-ski do que carros), e quando chegamos para a devolução, a bendita não estava aberta, só prá facilitar. Coisas do mercado local. Fomos lanchar e passear mais um pouco até conseguirmos devolver o carro, no final do dia. Fui comer com o Lucas num café local e ele, muito observador, me mostrou um casal sentado à mesa, cada um com seu laptop, comendo e sem nem olhar um para o outro. Enquanto estivemos no salão do restaurante não trocaram uma palavra sequer. Seria essa a modernidade que procurávamos para o nosso planeta?

Fomos então pegar o ônibus de volta para Santiago. Após o sufoco da ida (se lembram?), pegamos o ônibus leito e a volta foi maravilhosa até porque, o nosso cansaço já estava apertando pelos dias e mais dias de passeios e atividades. Dormir foi fácil. 

Chegamos em Santiago pela manhã e fomos direto para o apartamento do Carlos Patrício, meu amigo chileno que já tinha saído para trabalhar. Engraçado é que ao chegarmos no prédio, o porteiro não estava. Peguei a chave do apartamento, sem nenhum problema, no escaninho da portaria. Tomamos um banho e comemos algo. Saímos e passeamos por todo o centro de Santiago. Museus, igrejas, prédios oficiais e o teleférico, para uma vista total da bela cidade. Perto do museu de Pablo Neruda, tiramos uma foto com uma llama. O dono queria cobrar pela foto. Mandei o Lucas ficar bem ao lado da bicha, como se estivesse apenas mexendo no animal e, com meu zoom da máquina, peguei uma ótima foto. De graça enquanto o chileno conversava com outros turistas. De repente, Lucas se lembra de querer conhecer o estádio do Colo-Colo, time de futebol mais popular do Chile. Pegamos o metrô e fomos muito longe. Quase quarenta minutos até chegarmos na estação Pedrero. Valeu muito a pena prá mostrar a importância de um transporte popular eficiente. De repente, já na rua e com um sol alucinante, surgiu a dúvida: rodar o estádio pela direita ou pela esquerda? Ao decidir pegar à direita, passamos pela entrada das arquibancadas. Mas a sede era mais perto se fossemos pela esquerda. Rodamos o estádio todo, esfacelados pelo calor, sem nenhum bar para nos hidratarmos, já sem as camisas quando, finalmente, chegamos na sede do clube. Missão cumprida.

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